Ela tem uma rosa de Hyroshima dentro do peito e um coração tatuado na virilha.
Diz pros caras que é atriz, mas já faz cinco anos que não sobe no palco.
Frequentadora assídua da praça Roosevelt, ela usa All Star vermelho, vestido de xita, flores no cabelo e se pudesse deixaria as sobrancelhas se encontrarem só pra ficar parecida com a Frida Kahlo.
Quando chegou em São Paulo era ainda a “garota de Bauru”e fazia o papel da Cilene dos Sete gatinhos numa montagem ruim desses teatros de bar, hoje quase quarentona poderia fazer a Madame Clessi, sem muita maquiagem alias.
Veio pra estudar no TBC, mas quando descobriu que o Antunes batia nos atores, correu para o cordão de Ouro do Teatro Oficina e seus ácidos de Kombi azul.
Acorda às 16:00 e antes de escovar os dentes já liga no som “Blues da solidão”
Gosta de ouvir Lulu Santos, acha Cazuza um anjo, não perde um show do Velhas, quando a Rorô vem cantar no Sesc está sempre na primeira fila pedindo “Escândalo”, mas ela nunca canta.
Gosta de Villa-Lobos, Maria Callas e até Bjork, no entanto freqüenta baile funk na ZL, cheira loló na latinha de Skol e vomita no lixo do banheiro da balada, até seu fígado ficar exposto, mole, brilhando sobre um oceano de papéis amassados.
Não tem paciência para as alegorias de Lars Von Trier e adora tomar um “Drink no inferno”, interessa-se por Godard, mas limita-se a entender suas cores primárias, nunca foi ao reserva, porque lá não se pode comer pipoca durante a sessão.
Tem vezes que bebe vinho, outras Gim, coleciona latinhas de cerveja debaixo da cama, tudo depende do estado de espírito em que a sua casa se encontra, se os móveis estão no lugar ou não. Quando não bebe, se fode, porque o baseado da Paim sozinho não faz milagre.
Quando fuma prefere os modernistas.
Quando bebe entende os românticos.
Quando está desesperada os astrólogos da Folha de São Paulo.
Ontem ela me ligou e disse:
-Dei prum cara na pista de dança.
-Deu mesmo?
-Dei, eu até ia pro Dark, mas tinha um velhinho tarado lá dentro, um que sempre fica iluminando a galera com o celular dele, deu tempo do cara levantar minha saia e o tiozinho gozou no meu All Star novo.
-E você? – perguntei.
-Dei um chute no otário. Então seguimos pra pista, estava cheia, fomos prum espaço perto daquela caixa de som, tá ligado? Perto do lugar onde o DJ fica!
-Tô ligado sim. – respondi.
-Ele abaixou minha calcinha e fizemos tudo ali mesmo.
-E ninguém viu? Ninguém fez nada?
-Sei lá. –sua voz parecia agora embargada.- E se alguém visse também...a essa altura do festival já tinha cantado a Vaca Profana e tava pra lá de Marrakech.
Guilherme Junqueira