Sou um senhor de setenta anos já,sem grana, vergonha, sem tempo nem paciência pra mediocridade, barbudo por desleixo, bêbado por profissão.
Durante a semana freqüento mostras de cinema e galerias de arte, absolutamente sozinho, apenas a solidão me faz companhia, quando desejo uma companheira menos abstrata, vou para um bar de putas na Augusta, pago drink`s e pego números de celular, no dia seguinte, ligo pra elas e as levo para o Municipal, à Cinemateca, as vezes nem rola foda, deixo o amor para os babacas, para os caras que tem paciência (e tempo) pra perder.
Ouço Amália Rodrigues porque ela me faz pensar na morte de uma maneira mais poética, leio Vírginia Woolf porque ela me propõe uma existência mais digna, ao mesmo tempo que a consciência da minha ampla insignificância.
Fumo sem tragar, porque não quero morrer de câncer nos pulmões. Visto minha mascara de cinismo diariamente, mas procuro não sorrir com freqüência afinal morrer de felicidade também não é minha praia. Bebo porque é líquido, e com a bebida eu liquido minha insegurança , o problema é que passado o efeito do álcool ela retorna, fígado eu só tenho um.
Nunca precisei de um baseado para esquecer das coisas, mas para acender minha taba preciso esquecer do mundo, não fumo para trabalhar nem trabalho fumando, sou todo errado eu sei, mas ainda de uma forma misteriosa conservo minhas regras.
Sou anti-social SIM, vivo hibernado na minha bat-caverna o ano todo e nunca vou para nenhum evento, festa de aniversários, casamento, bodas de prata, primeira comunhão e principalmente, batizados. Dizem por ai que eu não gosto de crianças, MENTIRA, eu até gosto delas, caladas, num raio de pelo menos dez metros de distância do lugar em que eu estiver. O que acontece é que o mundo está cheio demais, e ter filhos (na realidade em que vivemos hoje) é como que uma afronta, decididamente as crianças deviam sair de moda.
Sou um velho, inconstante e volúvel, me irrito com facilidade e meus humores oscilam como ondas furiosas que fremindo suas cristas para o alto, se derramam numa bacia ampla e tudo se torna calmaria e mansidão. Ainda existe um caos dentro de mim que precisa ser domado, uma tristeza manifesta que reside sem porque.
Medo da morte?
Medo do NADA?
Medo de que?
Medo de mim talvez, medo de que minha vida não seja mais que uma sobrevida, certo de que todas as minhas ambições sempre foram pequenas, que meu melhor nunca foi suficiente, de que minha passagem por aqui foi insignificante demais, tortuosa de mais.
Feliz é a menina “ Baixo-Augusta” que teve o privilegio de assistir “La Traviata” comigo no Municipal na semana passada. Observei com curiosidade como ela reagia aos pontos de virada da história, aos cheiros dos assentos, às luzes, aos figurinos, às camadas de som.
-Foi a coisa mais bonita que já me mostraram.- ela me disse com os olhos cheios de lágrima quando a peça terminou.
Não me emociono mais com “La Traviatta” a beleza sempre fez parte da minha vida, talvez por isso tenha sido sempre tão infeliz.
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